Ousados como o Leão
Os ímpios fogem sem que ninguém os persiga, mas os justos são ousados como o leão. (Provérbios 28:1 A21)
Deus não está oculto em si mesmo, porque ele diz que o Espírito busca as coisas profundas de Deus — Deus percebe e contempla a si mesmo. Mas ele transcende tanto suas criaturas que os homens não podem encontrá-lo por seus próprios métodos e poderes. Ele não é incompreensível em si mesmo, porque ele diz que todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento estão em Cristo — Deus se compreende por sua própria onisciência. Mas ele é tão imenso em sua grandeza que suas criaturas podem estudá-lo por toda a eternidade e nunca saber tudo o que há para saber sobre ele.
Graças a Deus, portanto, por sua revelação. Embora não possamos encontrá-lo procurando, o Espírito o mostra a nós. E embora não possamos compreendê-lo, como em possuir conhecimento exaustivo sobre ele, podemos compreender tudo o que ele nos revela, como em possuir uma compreensão clara e exata do que ele nos ordena aprender. Deus é a verdade. O que ele pensa é verdade, e ele nos diz o que pensa na Bíblia. Ele nos diz a verdade sobre seu ser, suas obras, seus planos e prioridades, e seus padrões e julgamentos. Ele nos diz essas coisas não em códigos e quebra-cabeças, mas em discurso direto, e até mesmo as histórias e parábolas que ele conta contêm ensinamentos claros.
A religião que faz um espetáculo de proclamar a grandeza de Deus declarando nossa incapacidade de entendê-lo, mesmo que ele nos fale sobre si mesmo e nos diga para entender, é uma piedade preguiçosa e infiel. A verdadeira reverência estuda a revelação de Deus e se submete a tudo o que ela diz, mesmo que desafie nossos preconceitos e prejulgamentos, e mesmo que não deixe espaço para rebelião disfarçada de humildade. Esta é uma falsa humildade que grita louvores na face de Deus enquanto ele fala, para abafar sua voz, de modo a criar uma maneira de escapar de suas doutrinas e seus mandamentos.
A Bíblia é a revelação de Deus, e é verdadeira e clara. Podemos aprender com bons homens de fé, mas se somos verdadeiros cristãos, então, na realidade, nos importamos apenas com o que Deus pensa. Os homens, na melhor das hipóteses, podem nos explicar o que Deus pensa, e nos ajudar a considerar seu significado e aplicações, e nos admoestar a crer e obedecer. E esses homens devem ser derrubados, até mesmo fisicamente expulsos de nosso meio, assim que incitarem a incredulidade e a rebelião. Se alguma vez nos mantivermos firmes neste princípio, de que Deus fala na Bíblia, e em discurso claro e direto que não esteja sujeito a distorções fantasiosas, então estaremos no caminho certo para a fecundidade na fé de Jesus Cristo.
O pensamento da Bíblia é o pensamento de Deus. Não há diferença. E a Bíblia constantemente contrasta os justos e os injustos, os filhos de Deus e os filhos de Satanás, cristãos e não cristãos. É assim que Deus vê o mundo. Existem apenas dois tipos de pessoas. Existem cristãos, e podemos incluir ou excluir aqueles que ainda não foram convertidos, mas que mais tarde se tornariam cristãos. Como não conhecemos suas identidades, quando são incluídos, são referidos no abstrato, e não como indivíduos nomeados, exceto na mente de Deus. E existem não cristãos. Se excluirmos aqueles que se tornariam cristãos mais tarde, então este grupo consiste naqueles que nunca creriam no evangelho de Cristo, e que seriam lançados no inferno quando sua vida terminasse e quando o dia do julgamento chegasse. Uma maneira mais precisa de dizer isso é que a humanidade é dividida em eleitos e não eleitos, ou cristãos e não cristãos, dependendo da necessidade da discussão.
Os cristãos são chamados de crentes, e os não cristãos são chamados de descrentes. Os cristãos são chamados de sábios, justos e a luz do mundo. Todos os não cristãos são chamados de estúpidos, ímpios e trevas. É assim que Deus percebe e divide todas as pessoas, e é assim também que devemos perceber e dividir todas as pessoas. Devemos concordar ansiosa e alegremente com Deus, para que não sejamos contados entre os incrédulos, os não inteligentes, os rebeldes, que queimarão para sempre no lago de fogo. Como está escrito: “E a fumaça do tormento de tais pessoas sobe pelos séculos dos séculos” (Apocalipse 14:11). Mas aqueles que confiam em Cristo dirão: “Aleluia! A fumaça dela sobe pelos séculos dos séculos” (19:3). Quão diferentes são os pensamentos, atitudes e destinos daqueles que são salvos por Deus e daqueles que são condenados por ele!
É por isso que os justos são ousados. Não devemos temer os homens, que podem destruir o corpo e não podem fazer mais nada, mas devemos temer a Deus, que pode atormentar tanto o corpo quanto a alma no inferno. Mas como crentes, nossas vidas estão escondidas em Cristo, e por meio dele temos paz com Deus. Como diz o hino: “Qualquer que seja minha sorte, Tu me ensinaste a dizer: Está tudo bem, está tudo bem com minha alma”.¹ A ousadia do cristão não se baseia na autoaprovação — ele sabe que em si mesmo não pode estar à altura da perfeição de Deus e, portanto, ter comunhão com ele. Ele repudia toda confiança em si mesmo e entrega seu destino inteiramente a Cristo, para que possa ter comunhão com Deus com base na justiça de Cristo. Sua ousadia é tão forte quanto sua crença de que Cristo está certo com Deus e que o Pai aprova o Filho.
Minha confiança não precisa oscilar com meu desempenho. Eu olho inteiramente para Jesus Cristo, para que ele me salve e me leve diante do Pai, para que ele ateste por mim diante do trono celestial. Eu dependo de Cristo não apenas para ser introduzido a esta nova vida, pois mesmo agora, se eu fosse encarar Deus apenas com meus atos cristãos, não haveria esperança. Deus exige perfeição, e seria um insulto à sua santidade dizer: “Veja estas obras. Tenha respeito por mim por causa delas”. Mesmo se eu fosse um egomaníaco autoiludido, minha confiança não seria total e sem limites. E Deus não é apaziguado pelo ego gigante de um homem. Não, eu me apego a Jesus Cristo. Eu creio que Jesus Cristo é justo, e que ele sempre intercede por mim e fala por mim diante do Deus do Céu. E eu também vejo que esta posição correta diante de Deus é a única coisa que realmente importa, seja na vida ou na morte, ou na vida após a morte. Portanto, enquanto minha confiança em Cristo for inabalável e enquanto eu crer que ele é bom e fiel, serei ousado como um leão.
Por meio do Senhor Jesus, então, somos ousados para assumir o comando de qualquer situação, falar e fazer o que é certo, vindicar o evangelho de Deus, derrotar todo pensamento e movimento não cristão, calar a blasfêmia e humilhar a incredulidade. Como Paulo escreve: “Não importa o que aconteça, vivam de maneira digna do evangelho de Cristo, para que assim […] fique eu sabendo que vocês permanecem firmes em um só espírito, lutando unânimes pela fé evangélica, sem, de forma alguma, deixar‑se intimidar por aqueles que se opõem a vocês. Para eles, isso é sinal de destruição, mas, para vocês, de salvação, e isso da parte de Deus” (Filipenses 1:27–28). Que Deus glorifique a si mesmo concedendo maior força e ousadia ao seu povo.
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¹ Nota do Tradutor: Hino It Is Well with My Soul, composto Philip Paul Bliss, e letra de Horatio G. Spafford.
— Vincent Cheung. Bold as a Lion. Disponível em Sermonettes — Volume 2 (2010), p. 46–48. Traduzido por Luan Tavares (06/07/2024).