O Código da Vinci
O Código Da Vinci é um romance popular recente. Embora seu autor admita que ele é fictício, ele também afirma que o enredo é baseado em fatos históricos. Esses “fatos”, por sua vez, referem-se a uma conspiração na qual a Igreja escondeu informações a respeito de Jesus Cristo que, se descobertas, seriam prejudiciais ao que se tornou crenças cristãs ortodoxas. Como o autor admite, esses supostos “fatos” não são de fato novidade, nem é a primeira vez que foram escritos. Na realidade, eles são baseados em vários documentos, teorias e lendas com as quais estudiosos e crentes informados estão familiarizados desde… bem, desde sempre. E eles também foram refutados desde sempre.
Contudo, agora que essas teorias foram entrelaçadas em um suspense que muitos consideram divertido, elas estão repentinamente chamando a atenção do público em geral. E, claro, a maioria dos leitores não sabem como discernir fato de ficção. Uma história frequentemente pode desarmar a faculdade crítica das pessoas e transmitir teorias e crenças que estão por trás dela para o pensamento das pessoas, como se fosse por osmose. Seja uma história verdadeira ou falsa, o homem comum é facilmente influenciado pela história, porque a maioria das pessoas é irracional e sem discernimento. Portanto, seja transmitindo a verdade ou a falsidade, uma teoria ganha influência quando é colocada na forma de uma narrativa. Isso não significa que o método de contar histórias em si seja enganoso ou problemático, mas estou dizendo que uma teoria pode ter acesso à mente de uma pessoa irracional mais facilmente quando é transmitida como parte de uma história do que quando é apresentada de uma forma não ficcional.
Eu aprecio o trabalho que várias pessoas fizeram na formulação de respostas específicas ao Da Vinci, contanto que o conteúdo de seus materiais seja preciso e eficaz. Essas respostas, é claro, não se baseiam em novas pesquisas e reflexões, mas no que estudiosos e crentes informados sempre souberam e afirmaram, apenas que as informações agora são aplicadas ao romance.
No entanto, há dois grandes problemas que encontro com a maioria das respostas cristãs ao Da Vinci.
Um problema que tenho contra esses materiais não são as respostas que eles dão, pois no geral elas estariam corretas, mas a filosofia por detrás dos seus argumentos. Por exemplo, eles podem responder a uma reivindicação histórica do Da Vinci com argumentos formulados a partir de uma epistemologia puramente empírica. Embora seus argumentos ainda possam parecer sólidos em relação aos métodos de investigação estabelecidos (aceitos), eles podem refletir muita confiança e confiança no empirismo para estabelecer suas conclusões, argumentar em favor da fé cristã ou responder a ataques. Por causa dessa base defeituosa, toda a sua apresentação necessariamente se mistura a algumas das incertezas e problemas lógicos que são inerentes a essa abordagem. Usando outro tópico como ilustração, os cristãos podem usar argumentos científicos para argumentar contra a teoria da evolução. Ou seja, eles poderiam usar o método científico para formular argumentos científicos contra objeções científicas. Mas se em sua apresentação eles mostram uma confiança epistemológica na ciência, e se a ciência é em si mesma incerta, irracional e mesmo falsa (como argumentei em outro lugar), então sua abordagem faria parecer que o próprio Cristianismo é incerto, mesmo que o Cristianismo pareça mais provável que esteja correto. Portanto, essa seria a primeira reserva que tenho em relação às respostas cristãs ao Da Vinci.
Outro problema que encontro nas respostas cristãs ao Da Vinci é a sugestão de que não há mal algum para uma pessoa ler o livro se ela se lembrar de que é apenas um romance. Vários escritores admitem que acham o livro bastante agradável, apenas têm um problema com a alegação de que o enredo é baseado em fatos históricos. No entanto, o livro não é apenas impreciso sobre a história, mas o que é impreciso — sobre o que ele fala contra — tem a ver com a verdade da Escritura, a identidade e obra de Jesus Cristo e até a própria natureza de Deus. Portanto, a obra não é apenas “imprecisa” — é uma blasfêmia. Como esse é o caso, é um pecado para um cristão dizer aos outros: “Enquanto você conhecer os fatos, vá em frente e leia-o! De fato, é bastante divertido. Lembre-se apenas de que ele é um romance e não o leve muito a sério”. Mesmo que haja razões legítimas para lê-lo, esta certamente não é uma delas. Em vez disso, eu insistiria que um cristão peca muito se ele lê o romance por esse motivo, e um líder cristão peca ainda mais severamente se ele sugere que seria bom lê-lo por esse motivo.
Nunca devemos dizer às pessoas que é bom ler ou assistir a blasfêmia apenas porque é uma blasfêmia divertida, apenas porque não representa uma ameaça real à nossa fé, ou apenas enquanto não a levarmos a sério. Eu insistiria que é um grande pecado contra o Senhor ler ou assistir, ou dizer às pessoas para ler ou assistir, por esse motivo. Uma razão pela qual muitas pessoas não pensam assim é porque têm uma moralidade centrada no homem. Não permitiríamos que as pessoas assistam à pornografia apenas para que possam ser entretidas ou informadas, mas, de uma perspectiva centrada em Deus, a blasfêmia é muito pior que a pornografia. Como ousamos nos divertir com isso? Como ousamos? Que tipo de monstro eu seria se me divertisse com um romance que insulta minha esposa ou um filme que zomba dos meus pais? Mas é bom apreciar um romance ou um filme que blasfema contra nosso Senhor, desde que não o levemos a sério? Pelo menos deste ponto de vista, aqueles que pensam assim são tão culpados quanto o autor do Código Da Vinci. É melhor você ter uma razão muito melhor para ler o livro ou assistir ao filme do que mera curiosidade ou desejo de entretenimento ou controvérsia.
Agora que o Da Vinci está sendo transformado em filme,¹ é muito mais provável que alguns de vocês encontrem pessoas que mencionam o livro ou o filme para você. Não se distraia com a intensidade atual da badalação. Sua principal resposta ainda deve ser discutir questões fundamentais, como epistemologia, metafísica, para organizar um choque abrangente entre as cosmovisões do cristão e do incrédulo, e assim por diante. Para fazer isso, você deve revisar minhas obras Ultimate Questions, Presuppositional Confrontations e Apologetics in Conversation. Qualquer tempo que você gasta nos detalhes do Da Vinci deve levar a discussão de volta às questões fundamentais da cosmovisão e ao conteúdo do evangelho.
Isso não é muito diferente de quando alguém o desafia com a teoria da evolução. Sim, você pode usar argumentos científicos para derrotá-lo nesta questão, mas e daí? Mesmo depois de provar que a evolução é falsa com argumentos científicos, você ainda não provou que outros argumentos contra o Cristianismo são falsos ou que o Cristianismo está certo. Então, eventualmente, você ainda deve investigar os primeiros princípios dos sistemas opostos da filosofia. Portanto, embora nunca seja necessário, pode ser útil conhecer vários argumentos científicos contra a evolução, por nenhuma outra razão senão usá-los como argumentos ad hominem para mostrar que você não tem medo de lidar com a ciência ou mostrar que seu oponente está errado, mesmo se você empregar seus métodos irracionais.
Da mesma forma, também pode ser útil ter acesso a informações em relação às reivindicações históricas no Da Vinci. Portanto, no final deste artigo, estou listando vários recursos on-line sobre o assunto. Existem muitos outros, mas os que listei aqui são suficientes para responder aos desafios contra o Cristianismo que as pessoas podem ter ao ler o livro ou assistir ao filme. Também existem vários livros impressos escritos para responder ao Da Vinci, mas, novamente, esses sites devem ser suficientes, e são especialmente convenientes ao lidar com outras pessoas, pois você pode enviar os links por e-mail.
De qualquer forma, lembre-se de que as pessoas se recusam a crer no Cristianismo nunca porque têm argumentos ou evidências sólidas contra ele, mas porque, como a Bíblia diz, suas obras são más, de modo que amam as trevas e odeiam a luz. A falsa informação no Da Vinci é apenas uma desculpa para afirmar que eles fazem uma rejeição racional ao Cristianismo, embora não haja nada racional nisso. Portanto, a menos que o Espírito Santo trabalhe em seus corações para produzir arrependimento e fé, mesmo que as alegações do Da Vinci sejam completamente imprecisas, elas ainda se recusariam a crer, mas encontrariam outra desculpa para se esconder.
Portanto, deixar o incrédulo forçá-lo a dedicar muito tempo a qualquer tipo de objeção — seja Da Vinci, evolução, etc. — é cair numa armadilha. Ele sempre pode inventar algo para dizer, não importa quão ridículo seja, apenas para que você tenha que gastar tempo para refutá-lo. Note que, esteja ele conscientemente fazendo isso ou não, ele está apenas tentando fazer objeções para que não precise ser confrontado com a verdadeira condição de sua alma e a verdade sobre Jesus Cristo. De fato, no momento certo de uma conversa, você deve apontar isso e dizer: “Eu apontei as respostas contra as alegações feitas no Da Vinci. Agora você deve refutar essas respostas ou reconhecer que o Da Vinci não não representa realmente um problema para a fé cristã. Ou você ainda está se escondendo atrás do Da Vinci, não porque realmente lhe dá alguma objeção racional contra o Cristianismo, mas porque você está tentando encontrar uma desculpa para rejeitar a verdade?”.
O incrédulo quer impedi-lo de falar sobre ele — isto é, sobre o próprio incrédulo. Ele dirá qualquer coisa. Ele jogará qualquer coisa na sua cara apenas para que ele possa adiar um confronto real com Deus para um outro momento. Se não for algo do Da Vinci, será outra coisa. Então, sim, responda às suas objeções, mas sempre traga a conversa de volta para ele — a condição miserável de sua alma, seus pecados contra Deus e sua única esperança de salvação em Jesus Cristo. Faça-o defender suas crenças. Faça-o justificar seu comportamento e estilo de vida.
É verdade que Da Vinci menciona questões que é bom para os crentes conhecerem, mas o romance faz afirmações falsas sobre essas questões. Por exemplo, ele faz uma afirmação sobre a relação entre o Cristianismo e Constantino, imperador de Roma. Mas acho que o melhor cenário para aprender primeiro sobre esse e outros assuntos é um curso geral da história da igreja — uma apresentação positiva e organizada sobre o assunto — e não no contexto de uma refutação de uma parte de ficção popular que faz falsas alegações sobre a história da igreja. E, é claro, um conhecimento geral da história da igreja refutaria automaticamente o que é reivindicado no romance, uma vez que incluiria informações sobre o que realmente aconteceu na época de Constantino, e assim por diante.
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¹ [N. do T]: Lançado em 2006.
Vincent Cheung. Invincible Faith, pp. 174–177. Traduzido por Luan Tavares em 08/12/2019.