Erros sobre Santificação

As Obras de Vincent Cheung
8 min readFeb 2, 2021

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A maioria dos livros sobre santificação está cheio de erros e absurdos. Eles são caracteristicamente desleixados, imprecisos, antibíblicos, místicos e anti-intelectuais. Vejamos alguns exemplos de uma das melhores obras, Overcoming the World [Vencendo o Mundo], de Joel Beeke.¹ Alguns deles podem parecer triviais, mas não são, porque reforçam erros comuns que distorcem gravemente a compreensão e o desenvolvimento dos leitores cristãos.

Na vida espiritual, nos relacionamentos interpessoais, em todo o nosso labor, este princípio é verdadeiro: o caminho da bênção é o caminho da dor. (13)

Esta é uma generalização e ênfase antibíblica. Beeke provavelmente deseja universalizar e legitimar sua própria experiência, negatividade e incredulidade. O reino de Deus é justiça, paz e alegria no Espírito Santo. A bênção no espírito vem da fé, esperança, amor, conhecimento, cooperação, graça, misericórdia, santidade, vitória e muitas outras coisas maravilhosas. Em vez disso, Beeke enfatiza a dor. Isso é o que ele pensa da fé cristã e de Jesus Cristo. Ele também aplica isso aos relacionamentos interpessoais. Então é isso que ele pensa sobre sua esposa, seus filhos e seus amigos.

[Em seu livro In His Image, Paul Brand e Philip Yancey mostram como] A dor é um ingrediente essencial ao crescimento. Essa é a razão por que falamos em dores de crescimento e repetimos a expressão “Sem dor, sem ganho”. (13)

Esta é uma generalização antibíblica. É um sinal de infidelidade e incompetência oferecer slogans não cristãos como ensino cristão. Por que devo aprender lições não cristãs de um livro cristão? Que enganador. Que desgraça.

A piedade de Calvino é bíblica, com uma ênfase no coração mais do que na mente. A cabeça e o coração devem trabalhar juntos, mas o coração é mais importante. (44)

A primeira frase contrasta o “coração” com a “mente” e a segunda contrasta o “coração” com a “cabeça”. Portanto, como muitos outros, para Beeke a “cabeça” se refere à “mente” — mas então o que é o “coração”? Se o “coração” não é a mente, então deve ser não mental. Se for não mental, Beeke insiste em uma ênfase não mental na piedade. O que é uma piedade não mental? E como a piedade não mental pode interagir com a Escritura?

Se o coração e a mente são mentais, como podemos falar deles como se fossem partes diferentes de um ser humano? Onde está a justificativa bíblica para fazer essa distinção entre o coração e a mente? Além disso, por que a “mente” é chamada de “cabeça”? Beeke é naturalista ou evolucionista? A visão cristã é que a mente é incorpórea, de modo que o homem continua a existir e pensar mesmo depois que sua alma deixa o corpo na morte.

A Bíblia nunca considera a mente e o coração como partes separadas de uma pessoa. O que foi dito acima é um exemplo de uso de linguagem antibíblica para fazer uma distinção antibíblica, e então impô-la à força sobre a teologia e experiência cristã. Muitos dos ensinamentos anti-intelectuais sobre santificação são baseados nesta distinção. Devemos condenar e descartar essa falsa doutrina.

Como Gordon Clark escreve: “Portanto, quando alguém nos bancos ouve o pregador contrastando a cabeça e o coração, ele perceberá que o pregador não sabe ou não crê no que a Bíblia diz. Para que o evangelho seja proclamado em sua pureza e poder, as igrejas devem eliminar seu freudismo e outras formas de psicologia contemporânea e retornar à Palavra de Deus”.²

Nas ordenanças, Deus se acomoda à nossa fraqueza. Quando ouvimos a Palavra pregada indiscriminadamente, podemos indagar: isto é realmente para mim? Isto se aplica a mim? No entanto, nas ordenanças Deus nos atinge e toca de modo individual, dizendo: “Sim, é para você. A promessa se estende a você”. (57)

A Bíblia não ensina isso. Beeke inventou. É improvável que uma pessoa que duvida da palavra de Deus assim realmente venha a crer nas promessas de Deus por meio das ordenanças. Além disso, pode-se duvidar das ordenanças e se elas se aplicam a ele com a mesma facilidade com que ele duvida da palavra. Na verdade, ele poderia duvidar mais facilmente das ordenanças, uma vez que as ordenanças não usam palavras para dizer a ele que ele está incluído.

O homem rico queria ser ressuscitado dos mortos para advertir seus irmãos, mas Abraão disse que se eles não ouvissem a palavra de Deus, eles não ouviriam aquele que foi ressuscitado dos mortos. Então, se um homem que voltou dos mortos não conseguiu fazer uma pessoa crer, como as ordenanças podem fazer isso? Se alguém crê, depende do Espírito Santo, e o Espírito trabalha com a palavra. E se alguém tem fé nas ordenanças, é apenas porque crê na palavra de Deus sobre elas.

Mas, como ressaltou Robert Bruce: “Embora não recebemos um Cristo melhor, nas ordenanças, do que quando o recebemos nas Escrituras, às vezes nós recebemos mais dEle”. (93)

Não há evidência bíblica para isso. Além disso, que tipo de cristão recebe um Cristo melhor por meio das ordenanças do que por meio da palavra de Deus? Se eles são cristãos, devem ser péssimos cristãos. Bruce está dizendo que às vezes os cristãos preferem lidar com meros símbolos de Cristo do que com as próprias palavras que vêm desse Cristo. Beeke aprova e não condena essas pessoas. Que tipo de homem encorajaria tal doutrina maléfica?

A santidade e a oração têm muitas coisas em comum. […] Ambas são aprendidas por experiência e lutas espirituais. (93)

Esta é a voz de um enganador. Não, santidade e oração são aprendidas por meio da palavra de Deus.³

Um viver santo influencia e impressiona mais do que qualquer outra coisa. Nenhum argumento pode enfrentá-lo. (105)

Este é um erro comum e uma expressão de espiritualidade anti-intelectual. A palavra de Deus, ou um argumento bíblico, é sempre maior do que a santidade do homem. Beeke novamente insulta a palavra de Deus, como se estivesse decidido a menosprezá-la.

Conforme Spurgeon escreveu: “[…] Todas as nossas bibliotecas e estudos são mera futilidade, quando comparados com nosso lugar de oração particular”. (133)

Agora Spurgeon blasfema a palavra de Deus, enquanto Beeke o cita com aprovação. Se houver Bíblias em “nossas bibliotecas e estudos”, então este é um ataque contra a Bíblia. Ele até chama a palavra de Deus de “mera futilidade” em comparação com nossas orações. E se ele não tem a Bíblia em mente quando se refere a “todas as nossas bibliotecas e estudos”, então ele é mesmo um cristão? É suficiente dizer que devemos estudar e orar, sem recorrer a exageros piedosos. A verdade é que se uma pessoa negligencia o estudo da palavra de Deus, é seu quarto de oração que se tornará uma mera futilidade.

Visto que ele [Paulo] sabia o que era a ansiedade, podia ensinar aos crentes como evitar a ansiedade. Visto que ele havia lutado pessoalmente contra o medo, o pecado e o desapontamento, podia pregar sobre esses assuntos aos outros crentes (2 Co 1:3–7). (137)

Este é um erro comum derivado do pensamento não cristão. Nossa competência para tratar de um assunto vem do conhecimento da palavra de Deus e não da experiência. Paulo também fala a idólatras, homossexuais, bêbados, ladrões, mulheres, escravos, gentios e muitos outros tipos de pessoas. Beeke ou crê que o apóstolo foi todas essas coisas — incluindo uma escrava lésbica pagã bêbada — ou crê que o apóstolo estava errado ao falar com essas pessoas e, portanto, nega a inspiração da Bíblia. Leia 2 Coríntios 1:3–7. Isso ensina outra coisa. Paulo compartilha os recursos de Deus com as pessoas, não o discernimento da experiência.

Lembre-se: você é mais conhecido por suas reações do que por suas ações (Pv 16:32). (155)

Isso é um abuso flagrante de Provérbios 16:32 e parece algo que vem de um seminário de liderança secular ou de um livro de autoajuda. É um slogan não cristão e é ridículo. Hitler é mais conhecido por suas ações do que por suas reações. Os assassinos em série são mais conhecidos por suas ações do que por suas reações.

[Quando se trata de lidar com as críticas…] Se a sua consciência é pura, uma explicação simples e clara pode ser proveitosa em certos casos, embora o silêncio respeitoso seja frequentemente mais apropriado e eficaz (Mc 14:61) (156)

Esta é uma perversão de Marcos 14:61, que se refere a outra coisa. Não se trata principalmente de como lidar com as críticas.

A qualquer custo, esforce-se para não justificar a si mesmo; seus amigos não precisam disso, e seus inimigos provavelmente não acreditarão em sua justificativa. (156)

O conselho parece vir da psicologia popular. Ele deve oferecer apoio bíblico para isso, e reconciliá-lo com os exemplos dos profetas, dos apóstolos e do Senhor Jesus, que frequentemente atacavam seus críticos. Caso contrário, isso se torna uma crítica contra eles, e ninguém pode fazer isso sem colocar sua alma em perigo.

Se um dos apóstolos escolhido a dedo por Cristo O traiu por uma quantia insignificante, e outro jurou que não O conhecia, motivado por temor de uma criada, por que esperamos realizar nosso ministério sem traições ou deserções? (159)

Pedro pode ser aplicável, mas Jesus sabia que ele seria restaurado. Judas é um assunto diferente. Cristo não se surpreendeu com sua traição, mas sabia que Judas era um “diabo desde o princípio”, predestinado a trair o Senhor, para que a Escritura pudesse se cumprir. Ao dizer que Cristo foi traído, embora tenha escolhido seus discípulos a dedo, pode haver a implicação — provavelmente não intencional — de que ele cometeu um erro e, portanto, a declaração poderia incluir um elemento de blasfêmia.

Ore com aquele que o critica. Se ele o visita, sempre comece a visita com oração e peça-lhe que a termine com uma oração. (161)

Onde está o suporte bíblico para isso? Existem exemplos bíblicos dos profetas, apóstolos e do Senhor? Jesus pediu aos fariseus que orassem com ele e depois pediu-lhes que terminassem com uma oração? Ou este é apenas mais um conselho que soa piedoso que na verdade é falso e tolo?

O Senhor libertou Jó de seus ressentimentos contra seus amigos judiciosos, quando Jó orou por eles. (161)

Onde a Bíblia diz que Jó tinha ressentimentos contra seus amigos? E onde está escrito que Deus livrou Jó desses sentimentos quando ele orou? Isso é especulação. É um engano, porque um leitor pode pensar que está recebendo bons conselhos com base em um exemplo bíblico, quando esse não é o caso.

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¹ BEEKE, Joel. Overcoming the World. P & R Publishing, 2005 [Nota do Tradutor: Publicado pela Editora Fiel com o título Vencendo o Mundo: Graça para Vencer a Batalha Diária, São Paulo, 2008. Todas as traduções das citações foram extraídas desta versão em português, com as respectivas páginas].

² CLARK, Gordon H. The Biblical Doctrines of Man. The Trinity Foundation, pp. 87–88.

³ Veja CHEUNG, Vincent, Prayer and Revelation.

Vincent Cheung. Errors on Sanctification. Disponível em Doctrine and Obedience (2012), pp. 72–75. Tradução: Luan Tavares (02/02/2021).

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Written by As Obras de Vincent Cheung

Vincent Cheung é um pregador e escritor cristão. Ele e sua esposa moram nos Estados Unidos. “Tudo é possível ao que crê.” (Marcos 9:23)

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