Batismo, Circuncisão e Aliança

Vincent Cheung, Backstage (2016).

As Obras de Vincent Cheung
6 min readJun 21, 2021

Isto não tem a intenção de ser uma declaração definitiva sobre o batismo com água, mas levanta algumas questões que devem ser abordadas. Quer eu concorde ou não com uma doutrina, eu não gosto de argumentos ruins.

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Você já se deparou com a observação (e uma resposta a ela) de que a circuncisão não terminou porque foi supostamente substituída pelo batismo com água, mas porque foi cumprida por Cristo? Parece que essa observação é definitivamente verdadeira. O próprio Paulo argumentou que a circuncisão terminou por causa de Cristo, não por causa do batismo com água. Portanto, se não houvesse batismo cristão, a circuncisão ainda teria terminado, porque terminou sob outra base. Então, a questão é como o batismo infantil pode ser mantido na base de que a circuncisão foi substituída pelo batismo com água, já que se Deus fez ou não alianças com as famílias tornou-se irrelevante para o tópico.

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Uma das passagens principais é Colossenses 2:11–12. A interpretação que praticamente identifica o batismo com a circuncisão (de modo que o batismo substitui a circuncisão) seria assim:

Nele também vocês foram circuncidados, não com uma circuncisão feita por mãos humanas, mas pela remoção do corpo da carne, que é a circuncisão de Cristo,
= tendo sido sepultados juntamente com ele no batismo, no qual vocês também foram ressuscitados por meio da fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos.

No entanto, qual é a refutação, se um oponente se queixa que os versículos são lidos dessa forma apenas porque a conclusão desejada foi trazida ao texto pela força?

Suponha que o oponente afirme que é mais natural ler a passagem desta forma:

(1) Nele também vocês foram circuncidados, não com uma circuncisão feita por mãos humanas, mas pela remoção do corpo da carne, que é a circuncisão de Cristo,

(2) tendo sido sepultados juntamente com ele no batismo,

(3) no qual vocês também foram ressuscitados por meio da fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos.

E se o oponente afirma que, em vez de falar sobre uma coisa (circuncisão = batismo), a passagem está falando sobre três coisas (circuncisão, batismo, ressurreição/fé)? Ou pelo menos a circuncisão espiritual e o batismo físico como duas coisas diferentes, duas operações inteiramente distintas?

Agora, (a) se as evidências circunstanciais (como aquelas passagens em Atos) forem inconclusivas, nem provando nem refutando a doutrina, (b) se a interpretação de Colossenses 2 for desacreditada ou pelo menos tornada inconclusiva tão rapidamente, (c) e se a circuncisão não terminou porque foi substituída pelo batismo com água, mas por causa da vinda de Cristo, como Paulo argumentou em Gálatas e em outros lugares, então os argumentos das passagens bíblicas usuais perdem sua força. Além disso, todos os argumentos baseados na aliança se tornariam irrelevantes, porque esses pontos significariam que, quer Deus faça ou não uma aliança com as famílias, ele não tem que associar nenhum sinal físico com ela.

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É claro que a continuidade do AT e NT não deve ser contestada. No entanto, se o batismo com água é um sinal da aliança, e se o sinal da aliança deve ser aplicado a todos os membros da família, e se é uma obrigação moral (de modo que seria pecado negligenciá-lo ou recusá-lo), então, o ônus sobre o reformado seria estabelecer sem dúvida (1) que ainda deveria haver um sinal físico para a aliança, (2) que o raciocínio de Paulo por trás de Gálatas e outros lugares não anula um sinal físico, (3) mas apenas cancela a circuncisão como um sinal físico, (4) enquanto o mesmo raciocínio de alguma forma permite, até mesmo impõe, outro sinal físico, (5) mas ao mesmo tempo remove o significado que os judeus colocaram sobre um sinal, (6) e estabelece sem dúvida que este sinal físico tenha se tornado o batismo com água. Seria um feito incrível.

Estamos convencidos de que os argumentos reformados fizeram isso? Mesmo que os argumentos reformados sobre o batismo sejam fortes o suficiente para permitir sua doutrina, eles são fortes o suficiente para serem aplicados? Para impor uma obrigação à consciência de todos os crentes? Para declarar que é pecado recusar? Os reformados desejam colocar sua doutrina neste nível, mas se os argumentos são circunstanciais e inconclusivos, e se os princípios e suposições essenciais são tornados irrelevantes, então eles são insuficientes para produzir esse efeito. Essa é a dificuldade que eles devem superar para que sua doutrina defina o pecado e controle a consciência, como eles querem fazer.

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A premissa é que Deus faz alianças com as famílias e o batismo é um sinal da aliança que se aplica aos membros da família. Vamos considerar o sinal primeiro. (1) Foi estabelecido que há um sinal físico da aliança sob Cristo? (2) Foi estabelecido que o batismo com água é um sinal físico da aliança? Ora, se o batismo é um sinal da aliança, e se ele substitui a circuncisão de modo que o batismo permaneça e a circuncisão termine, então por que Israel foi “batizado” na água sob Moisés quando eles tinham o sinal da circuncisão (1 Coríntios 10:2)?

Quanto à aliança em si, Deus nunca fez uma aliança com as famílias da maneira que algumas pessoas assumiram. O argumento de Paulo em Romanos 9 é que Deus nunca prometeu salvar famílias como tais, mas apenas prometeu salvar a “fé” — a fé dos indivíduos. E esses indivíduos poderiam estar muito distantes daqueles que tinham o sinal da circuncisão. Portanto, mais gentios do que judeus estavam recebendo a salvação por meio de Jesus Cristo. Na verdade, ele disse que “nem todos” os membros da “família” eram filhos de Abraão. Suponha que eu receba Jesus, e Deus diga que sua aliança agora pertence a mim e a meus filhos. De acordo com o raciocínio de Paulo, embora Deus prometa salvar meus filhos, ele pode considerar apenas dois em cada dez deles realmente meus filhos, porque apenas dois teriam fé. Isso torna o conceito de aliança com famílias, no contexto deste tópico, totalmente sem sentido.

Portanto, a circuncisão alguma vez significou algo como os reformados pensam? Do contrário, mesmo que o batismo substitua a circuncisão, que eles devem estabelecer, o batismo ainda não significaria o que os reformados pensam.

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O mais importante é a circuncisão do coração. Esta tem sido a ênfase de Deus desde o início (Levítico 26:41, Deuteronômio 36:10, Jeremias 4:4, Jeremias 9:25–26, Atos 7:51, Romanos 2:28–29). Embora fosse importante obedecer à ordem de Deus sobre a circuncisão, os judeus usaram sua ênfase na circuncisão física para se justificarem da circuncisão espiritual. Muitos que anatematizam as pessoas no batismo com água estão na mesma condição. A religião deles é se molhar da maneira certa e na idade certa. Eles nunca foram batizados ou circuncidados em seus corações e não querem que ninguém saiba disso.

O sábado era importante, mas Jesus disse que o sábado foi feito para o homem, não o homem para o sábado. Ele disse para descobrir o que Deus quis dizer quando disse que queria misericórdia, não sacrifício. Deus não está criando cristãos apenas para ter mais pessoas para batizar. Se não estamos recebendo misericórdia e mostrando misericórdia fazendo o que ele manda, como pregar sobre a vitória em toda a vida, orar com fé, curar os enfermos, expulsar demônios e profetizar para obter discernimento e conforto, então de que adianta, se somos batizados da maneira certa? Não estaríamos fazendo o que Deus deseja de qualquer maneira.

É por isso que eu desprezo e desconfio principalmente daqueles que são insanamente zelosos por sinais e rituais físicos. Eles parecem ser movidos por um espírito estranho. Há algo errado com eles que querem esconder e estão tentando distrair as pessoas, até eles mesmos, do problema real. E eles nem mesmo oferecem argumentos melhores enquanto fazem isso, o que nos mostra ainda mais sobre sua corrupção espiritual e intelectual.

Do: e-mail

Vincent Cheung. Baptism, Circumcision, and Covenant. Disponível em Backstage (2016), pp. 50–53. Tradução: Luan Tavares (21/06/2021).

© Vincent Cheung. A menos que haja outra indicação, as citações bíblicas usadas neste artigo pertencem à BÍBLIA SAGRADA, NOVA ALMEIDA ATUALIZADA ® NAA ® Copyright © 2017 Sociedade Bíblica do Brasil. Todos os direitos reservados.

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Vincent Cheung é um pregador e escritor cristão. Ele e sua esposa moram nos Estados Unidos. “Tudo é possível ao que crê.” (Marcos 9:23)

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